ACEITA uma xícara de café?
- Lilis | Linhas Livres
- 21 de fev. de 2019
- 3 min de leitura
Atualizado: 14 de mai. de 2019
Por Neia Mira
Imagem Divulgação
Sempre que sinto o cheiro de café fresquinho e vejo uma mesa posta para o café da manhã, lembro-me de alguns momentos marcantes da minha vida. Um deles acontecia sempre na casa da minha avó paterna, a já falecida Izolina Gonçalves de Almeida. Ela nos acolhia com tanto amor, sempre fazendo algo para gostoso, para qualquer um que a visitasse, principalmente os netos.

Eu só me levantava da cama ao sentir o cheiro do café pelo ar e ao ouvir os cocoricós das galinhas no quintal. Lembro-me da minha avó desde a infância, quando morava no Distrito de Cesar Neto, em Anhumas (SP), vizinha de Botucatu. Viajávamos muito de trem para aquela região para visitar familiares, mas o mais importante era descer ali na estação de Cesar Neto e ver minha avó, aquele lugar de ar puro e de muita paz, além de liberdade, pois era um local muito tranquilo.
Podíamos sair por ali por perto sem nenhum perigo, coisas que na cidade grande não podíamos. Sempre que visito este lugar em minha memória ouço até o barulho do trem, dos garçons vendendo lanches – que por ser viajem de trem, demorava mais tempo para chegar que qualquer outro veículo -, dos animais vistos pelo caminho, paisagem das fazendas, sítios e, claro, fica mais intensa a lembrança da minha amada avó. Que delícia relembrar!
Outro momento marcante era quando eu levantava cheia de amor na casa dos meus pais. Quando ainda era solteira, eu preparava o café para os meus irmãos pequenos e levava até a cama. Era como se eu fosse preencher a falta do papel da minha mãe, Leonilde Viana de Almeida (falecida), já que ela precisava trabalhar para ajudar nas despesas de casa.
Lembrar daquelas carinhas de alegria, por estarem sendo mimados pela irmã mais velha, me incentivava ainda mais a repetir esses gestos. Às vezes não tinha dinheiro em casa para comprar algo diferente, mas eu me virava com o que tinha para proporcionar aquele momento de aconchego. Lembro até hoje do primeiro bolo que inventei de fazer, sem ter noção de como fazer. Ficou uma borracha e eles comeram, acredito que fizeram esforço para não me chatear, coitados.
Quando comecei a trabalhar, se não me engano por volta dos 13 anos de idade, esperei o dia do pagamento ansiosamente para poder preparar o café da manhã deles com, digamos, o meu suor. E assim fiz, o meu irmão caçula, dentre os homens, até hoje comenta sobre estes momentos e vejo no rosto dele a expressão de reconhecimento do amor e carinho que eu dava. O carinho e cuidado por eles não acabaram, incrível isso.

Os filhos eram da minha mãe, mas tudo que ela passou com eles, passei junto, como se fossem meus também. Minha mãe não está mais aqui entre nós, mas antes de partir ela disse que eu era o melhor presente da vida dela, não que ela não amasse os demais, é que, na visão dela, eu a ajudei do jeito que pude a cuidar os demais sendo que, por pouco, eu quase não fiz parte desta vida por causa de um risco de aborto que ela sofreu.
Talvez algumas pessoas ao lerem este texto possam acha-lo simples, mas não fazem ideia do quanto essas histórias são importantes para mim. O caso da avó, por exemplo. Ela fazia tudo com tanto carinho, então na casa da minha mãe eu me esforçava para retribuí-lo aos meus irmãos. Ao escrever este texto vejo que essa coisa do cuidar, proteger, sempre foi uma característica minha, desde que me conheço por gente. Isso talvez justifique o fato de eu querer abraçar o mundo, e ele me abraçar de volta, sempre.
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Néia Mira
Mulher guerreira de origem simples e família grande, aprendeu cedo a lutar pela vida e a mediar conflitos. Além de esposa, mãe, amiga e apaixonada por crianças, é também militante feminista e pacificadora educacional. Além de estudante quartanista de pedagogia, é coordenadora do curso de capacitação de Promotoras Legais Populares (PLPs) do Instituto Plena Cidadania (Plenu) e tem como foco a educação emancipadora como forma de combate à violência contra as mulheres. (Leia mais aqui!) Foto San Paiva
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