ANTÔNIO CAJUEIRO, o avô que alimenta!
- Lilis | Linhas Livres
- 5 de jul. de 2018
- 4 min de leitura
Atualizado: 19 de set. de 2018
Por Eduardo Lira
Fotos Arquivo Pessoal

É 2001. Mais um dia e meu avô, seu Antônio Cajueiro, madruga para ir à feira da cidade de Glória – Nossa Senhora da Glória (SE). Levanta e se arruma enquanto minha avó, dona Orisa, passa o café. Arruma a carroça e dá comida aos animais. Daqui a pouco todos vão se pendurar a caminho de mais um sábado da Feira do Fato.
O sol vai nascendo e a carroça vai encostando ao meio do percurso, na rodovia, para dar uma mão a quem vai a pé. Quando para, é possível observar que, agora, em tempo de chuva, em alguns sítios as pessoas limpam a lama das fontes onde há pouco tempo a terra sequer havia grama, apenas rachaduras causadas pela seca fervente.
Mas então, as mesmas rachaduras foram tapadas pela água que escoa da breve chuva do começo de ano, ali a lama toma conta e enche a reserva de água, que não dura muito, mas é o suficiente para alegrar. As pessoas se limpam com gosto de poder sentir úmido o chão que quando não é lama, é lava.
O contraste de climas e épocas é o vice e a versa da vida no sertão. Ora fartura, ora vidas secas. E que grande a secura...
Saindo da rodovia e entrando na cidade começam as ruas de terra partindo para os paralelepípedos, o asfalto fica para trás onde a importância é governamental. Ali vai descendo quem pegou carona. Passa por outras carroças e alguns carros. Cumprimenta todo mundo que passa ao lado, inclusive as crianças que acordam cedo para ir jogar bola e estourar os dedões nos campos de piçarra.
O barulho é louvável na pequena cidade, mais tarde tem festa de Reis, mas ainda é cedo a Rua do Fato, que gerou nome à feira, ou quem sabe foi o contrário; é onde todo mundo se encontra, todo mundo se conhece e todo mundo é parente, mesmo que de sétimo grau. É só falar de quem é filho ou neto que quatro primos, dois irmãos e cinco tios aparecem querendo saber como você está e dizer o quanto você cresceu.
Adentrando a feira, se entende o porquê de fato é rua do Fato. Fato também são miúdos de animais e por todo lado se encontra. Vê também peças de carnes inteiras, animais vivos, algumas plantas, mas o que predomina é de fato, o Fato. Mas capinando mais ao fim se acha o que geralmente se enfeira. O cheiro de coalho paira pelo ar, as vozes das ofertas de frutas e verduras soam ao redor e as cores brincam com o olhar.
A tarde vai chegando e tanto seu Cajueiro quanto as outras pessoas vão indo para suas casas, à noite tem festa de Reis e no outro dia cedinho tem missa na igreja da praça da Bandeira, atrás da grande estátua da padroeira da cidade – a quem lhe deu nome.
E no domingo mais tarde tem feira agropecuária, onde quem quiser pode aproveitar a vaquejada. A cidade congela para ver dois cavaleiros derrubando um boi em um espaço mínimo e totalmente limitado. É atração e euforia. Mas mais do que isso, a cidade inteira quer subir nos touros dos rodeios do interior e nos cavalos e pangarés mais caros do sertão.
De feiras e pula boi, pula cavalo daqui uns dias começa o Carnaforró e depois o Carnaxé, são as preparações para o verdadeiro carnaval. Trios elétricos vão passando de cidade em cidade arrastando as pequenas multidões para uma grande multidão, a cidade se reúne, metade vai para a folia, a outra metade para a procissão.
Vó Orisa vai com as filhas para a oração. Enquanto alguns filhos de Cajueiro vão para a capital festejar o carnal. Mas ao fim todos os dias se reúnem em volta da mesa de jantar, esperando Cajueiro por uma bacia em cima e dar uma colher em cada mão. Todos comem no mesmo prato, talvez não na mesma proporção, mas ali se entendem e preferem assim dividir o pão.
A cidade, depois da folia, volta à sua rotina. Seus menos de 40 mil habitantes voltam a todos os sábados irem à feira do Fato e aos domingos à missa ou em alguma procissão. Isso dura até que chegue outra época, onde a lama já seca traga alguma outra diversão e os pés caminhem outra nova direção das ruas de paralelogramas. Como o famoso São João. Mas até chegar o momento de acender a fogueira, vai um baita dum tempão...

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Eduardo Lira
Eduardo Reis Lira é sergipano criado e crescido em Sorocaba (SP), estudante de Jornalismo pela Universidade de Sorocaba (Uniso) e amante de livros, séries, sagas e poesias. Taurino, faminto por doces e pelos momentos capturados em fotografias, tenta transcrever os sentimentos em suas linhas. Atualmente é estagiário na Assessoria de Comunicação da Universidade de Sorocaba. (Leia mais aqui!) Foto Flávia Chaves.
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