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MEU PAI, meu herói!

  • Foto do escritor: Lilis | Linhas Livres
    Lilis | Linhas Livres
  • 26 de ago. de 2018
  • 4 min de leitura

Atualizado: 19 de set. de 2018


Por Marie Chervenkov

Foto Arquivo Pessoal


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Ele nasceu e deram-lhe o nome de Jaurival, que foi carinhosamente reduzido a Jau. E assim ficou para a família, amigos e conhecidos. Jau cresceu no sítio, tornou-se vizinho dela, a Mêlania. Se conheceram na juventude e se apaixonaram, casaram-se e, a partir dali, formaram uma grande família, com sete filhos, 17 netos e 16 bisnetos – dois netos e seis bisnetos que vieram depois que ele faleceu.


Ele sofreu a triste experiência de ter que enterrar uma neta, com apenas 8 anos de idade, uma criança acometida por um câncer agressivo. Seu sofrimento era estampado no rosto. Ele amava muito a netinha, dizia que era linda, inteligente e graciosa, e que o fazia rir muito. A família era a coisa mais importante da vida do meu herói. O momento mais feliz para ele era quando todos iam chegando em sua casa.


E, olha só, eram muitos! Lá no sítio havia muito espaço e isso nunca foi problema, pois o coração do meu herói acompanhava, sempre teve espaço para mais um agregado. Como tudo na vida, existe aquele momento em que as coisas mudam e, isso também aconteceu na da vida dele. Houve um tempo, uma verdadeira revolução, e foi preciso sair do sítio e ir morar na cidade grande.


Essa mudança - para quem planta e come do que planta, que desperta com o canto do galo, dos pássaros, com as galinhas cacarejando, os cavalos relinchando, os porcos gritando por comida e as plantações esperando o seu toque de carinho e amor, para quem viu os filhos crescendo em liberdade -, essa foi a parte mais difícil e dolorosa. O desvincular, para deixar a vida somente em memórias.

E como se não bastasse todas essas mudanças, ele ainda teve que começar tudo de novo. Mas ele era um grande guerreiro, travou uma grande batalha, e a vitória foi certeira. O tempo foi passando para todos e devido essa velocidade, foi pouco percebido. De repente os filhos já estavam grandes e o laço paternal do dia-a-dia foram se rompendo aos poucos, assim como os pássaros.


Aprendem a voar e um certo dia se preparam para o voo da independência e da nova família que irá se formar. Claro que tudo isso iria mesmo acontecer por partes. Entretanto, para o meu grande herói, a despedida e o percurso da vida eram muito dolorosos. Doía ter que aceitar que seus amados filhos batiam as asas e voavam. Se preocupava demais com o bem-estar e a segurança de todos.


Tanto que as perguntas sempre eram essas: “Você não esta passando fome, frio, ninguém está te agredindo?” Que amor de pai! E saber que sua inocência era exatamente oriunda da criação, formação moral, e os bons costumes que lhes foram transferidos por meio de gerações. As memórias jamais irão se apagar e serão sempre contadas pela prole.


A felicidade era total quando estávamos reunidos naquela casa simples. Meu herói sempre dizia que a comida era simples, porém, feita com muito amor pela amada esposa, a única companheira que, lá na juventude, se uniu a ele para formar a família que amava muito. Ele sempre conchegava a todos com muito amor e carinho. Se ficasse doente, ele sempre estava ao lado, dando o seu apoio.


Quando estávamos juntos e as perguntas eram feitas sobre alguma coisa dos antepassados dele ou sobre sua infância, as respostas e as gargalhadas aconteciam de forma conjunta. Às vezes ríamos de doer a barriga com suas histórias, pois ele era um bom contador de causos. A memória sempre foi boa, com personagens que tiveram um papel muito importante na formação dele.


Claro que meu herói tinha seus gostos e manias, mas não consigo apontar-lhe um adjetivo que não seja bom. Em suas histórias de vida, das quais queríamos muito conhecê-las, ele foi um grande homem, muitas delas aconteceram com finais felizes, outras tristes e até cruéis, mais ele enfatizava sempre sua vitória.

Em 25 de julho ele veio ao mundo e, se tivesse aqui, completaria 90 anos neste 2018. Porém, aos 67 anos começou apresentar sintomas que a sua saúde não andava muito bem. Procurou ajuda de um profissional em medicina, que lhe requisitou vários exames e, assim, foi diagnosticado com um câncer de próstata. A partir dali começou a corrida mais importante da sua vida, lutar por ela e, por dias melhores, sem dor.


Por ironia do destino, as datas mais importantes da sua vida foram marcadas pelo mês de julho – nascimento, casamento e, faltando apenas seis dias para ele completar 76 anos, veio a falecer. Era 19 de julho de 2004. Vitimado pelo maldito câncer que o venceu depois de nove anos de luta intensa – mais uma data compunha a sua história, só que desta vez marcada aos seus entes queridos.


Tudo mudou muito, ficou um vazio imenso em minha vida, na vida dos meus irmãos e da minha mãe, que esteve ao seu lado por 55 anos. A casa não é mais a mesma, os nossos almoços perderam o encanto e sobre as histórias e estórias, só temos aquelas que foram contadas há muito tempo. Porém, o meu amor é eterno e a saudade é e sempre será imensa.


“Meu pai, meu grande herói! Hoje no céu, sempre olhando por nós com todos os anjos e arcanjos. Sempre te amarei, querido! Obrigada por ter sido um pai maravilhoso para mim e para meus irmãos”.

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Marie Chervenkov


Mãe de três filhos, avó de cinco netos, aposentada, mas ativa como profissional liberal. Neta de russo e búlgaro, rígida em suas escolhas e observadora de todos os momentos, tornando-os experiência e aprendizado. Tem 62 anos, é solteira, ama a natureza, música, poesia e a arte como um todo. Sincera, amiga e fraterna, gosta da magia, do encanto e dos detalhes da vida. (Leia mais aqui!) Foto San Paiva | Fotopoesia


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