A PRAYER aos nossos hermanos, os venezuelanos!
- Lilis | Linhas Livres
- 7 de set. de 2018
- 4 min de leitura
Atualizado: 19 de set. de 2018
Por Tatiane Patron
Fotos (1) La Patilha e (2) Jheny Christofoletti
Sempre achamos que os nossos sofrimentos são maiores que os do outro. Mas a verdade é que sentimento não tem tamanho, impossível medir. Tenho ouvido tantas histórias surpreendentes que preciso compartilha-las. Principalmente porque, às vezes, justamente quem subestimamos (ou julgamos) não está vivendo na zona de conforto, como pensamos, mas sim numa zona de guerra, por vezes, interna. E o instinto de sobrevivência fala mais alto, dita os atos, os rumos e o destino.

Onde moro atualmente, em Orlando, na Flórida (EUA), têm pessoas do mundo inteiro, porém, a maioria é venezuelana – como no restante do país, o primeiro na lista dos venezuelanos, que também estão à frente do ranking de pedido de asilo -, estima-se que cerca de 100 mil venezuelanos entraram no país nos últimos quatro anos. Entender a atual política socioeconômica da Venezuela é complicado.
Resumidamente, desde o final do governo de Hugo Chávez (2013) até o atual, de Nicolás Maduro, a repressão política fez com que a economia do país entrasse em colapso, levando a inflação à 13.000% - a mais alta do mundo, segundo o Fundo Monetário Internacional (FMI). O resultado está associado à má administração da economia interna, principalmente quanto ao petróleo, mas a corrupção política, a escassez de produtos básicos, o fechamento de empresas, e a deterioração e a redução da produtividade têm fomentado o agravamento da crise venezuelana.
Na prática, falta comida (75% da população emagreceu cerca de 10 quilos nos últimos dois anos), o desemprego é elevado e os índices de violência aumentaram, segundo relatório da Organização das Nações Unidas (ONU), 2018. Ainda de acordo com o Alto Comissariado da ONU para Refugiados, a Acnur, o número de venezuelanos pedindo asilo no exterior cresceu 2.000% desde 2014, levando a organização a orientar os outros países para que tratem os imigrantes venezuelanos como refugiados políticos.
E é a partir das histórias dos meus novos amigos, refugiados aqui, que tenho aprendido que, realmente, dinheiro não é tudo e nem sempre traz felicidade. “Toda a vida é um país estrangeiro”, Jack Kerouac.
São pessoas que tinham boas profissões, casarões dos mais lindos, que conheceram o mundo inteiro mas que tiveram de largar tudo, deixar para trás a pátria amada para viver num outro país, sob asilo político, enfrentando a diversidade da língua, cultura e condições de trabalho impostas por outrem. Ou seja, ter a carteira recheada de platas não significa ter comida na mesa, simplesmente porque não se tem o que comprar para comer na Venezuela.
Conheci recentemente uma moça chamada Daiana, uma venezuelana linda, jovem, cabelos longos, que em seu país se formou poliglota. Em um dos nossos bate-papos ela me contou um pouco da vida. Em época de boa economia na Venezuela, o pai a levou para conhecer o Brasil, Portugal, França e Estados Unidos – este último, um lugar que ela nunca imaginou que viria morar.
A crise a expulsou do seu país de origem. Há quase um ano vivendo em solo norte-americano, ela mantém contato com o pai, que ficou, pelas redes sociais. Neste mesmo período, ele perdeu mais de 20 quilos, apesar da tristeza, não foi ela a vilã, foi simplesmente porque não há o que comer. As prateleiras dos mercados estão sempre vazias.
Maria, um nome tão comum em qualquer parte do mundo, mas que aqui é tem rosto e história. Venezuelana, Maria tem cabelos louros, estatura baixa e rosto angelical. E se torna uma soberana com sua história. Ela revelou que seu casamento de oito anos acabou depois que ela teve que largar tudo e morar com os pais em Orlando. O marido, na tentativa de legalizar sua vinda, tentou tirar o visto americano diversas vezes.
Sem sucesso, decidiu partir para outro país da América Latina. “Eu era bancária na Venezuela. Atualmente limpo quartos de hotel.” A questão aqui, não é status empregatício, mas a mudança brusca que inclui severas adaptações. Mesmo assim, a venezuelana sorri e diz que está feliz por não passar mais necessidades.

Já Juan (na foto) é um muchacho que atravessou a fronteira do México em busca de estabilidade e um prato de comida em solo estadunidense. O pai também tentou passar pela fronteira dos países, mas a imigração o pegou. Agora ele está preso esperando o governo norte-americano decidir qual será seu futuro. Ele desabafa que na chamada América todos têm perspectiva de vida.
“Aqui temos prato cheio de comida em todas as refeições do dia. Na Venezuela as pessoas estão literalmente morrendo de fome. É muito triste ver meu país assim.” Ouvindo tantas histórias similares entendemos que, de alguma forma, somos abençoados por termos opções de escolhas. Esses relatos não foram escolhas, são resultados da busca pela sobrevivência. Não há fita-métrica para medir.
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Em tempo, em abril passado, o vice-presidente dos EUA, Mike Pence, anunciou a doação de US$ 16 milhões para a Colômbia e ao Brasil, como forma de apoio aos refugiados venezuelanos. Já em julho, ofertou mais US$ 6 milhões aos colombianos, somando já US$ 26 milhões desde o início da Crise na Venezuela. Ainda assim, vale lembrar que o governo de Donald Trump tem uma posição contrária à imigração e, desde a campanha presidencial, tem discurso radical para o combate, inclusive de refugiados. Recentemente o presidente andou amenizando a posição por se tratar de questão política.
O fato é que, apesar de estarem encontrando um prato de comida em solo estadunidense, o massacre social do povo venezuelano parece estar longe de terminar. Recentemente também, o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) divulgou relatório em que informa que o Brasil já tem 60 mil imigrantes venezuelanos, sendo que 10 mil deles chegaram somente neste 2018. Nas cidades próximas à fronteira, famílias inteiras se espalham, sem recursos. Mas poucos alcançam os grandes centros.
"Ser brasileiro é não ser estrangeiro em terra alguma (porque somos oriundos de todas)!”, Diogo Santos.
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Tatiane Patron
Jornalista, aventureira e gosta de boas histórias, seja para ouvir ou contar sua própria. Trabalhou em jornais impressos de Sorocaba (SP) e São Paulo (SP), também tem experiência em rádio e televisão, e teve sua própria de agência de comunicação. Atualmente, com 30 anos – desbravando a fase balzaquiana -, está em busca dos seus sonhos em Orlando, nos Estados Unidos, e é de onde contará suas aventuras. (Leia mais aqui!) Foto Jheny Christofoletti.
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