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EU E ELA, a endometriose!

  • Foto do escritor: Lilis | Linhas Livres
    Lilis | Linhas Livres
  • 3 de jun. de 2018
  • 5 min de leitura

Atualizado: 19 de set. de 2018


Por Miriã Almeida

Imagem Divulgação


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A nossa história começa há alguns anos, não sei dizer ao certo quantos anos atrás, mas me lembro de ser pequenina quando senti sua primeira aparição. Eu ainda era criança, tinha quase dez anos de idade, e tudo era novidade. Minhas amigas me idolatravam na escola achando que aquilo era a melhor coisa do mundo – e, confessamos, toda menina espera por essa transformação com certo “entusiasmo”, mas as coisas não são bem assim, principalmente na prática.


Para aprender a lidar e levar essa minha jornada, que iria ser quase para sempre, foi um desafio – e também é para grande parte das meninas, até mesmo às mulheres no geral. Dores, espinhas, mudanças e transformações marcam esse processo. Fora isso, vêm as dúvidas, as contagens dos dias do mês, e ah!, o que são abas mesmo? Que confusão...


Mas esse texto não é sobre a transformação feminina, é sobre Ela, com E maiúsculo, E de Endometriose. Nominho difícil, doença complicada, mas respeitemos, Ela habita em mim. Não se espante com o nome complicado ou com o fato de não saber sobre o que se trata, vamos lá eu a apresento: a doença Endometriose vem do endométrio, o tecido que reveste o ovário, que nos casos da doença, acaba se espalhando para outros órgãos como as trompas, ovários, intestinos e bexiga.


Isso ocorre porque quando não há gravidez, o endométrio descama e ao invés de ser totalmente expelido na menstruação, ele faz o processo ao contrário, atingindo os órgãos. É considerada uma doença incurável e segundo os dados de 2017, fornecidos pela Associação Brasileira de Endometriose, a doença afeta cerca de seis milhões de brasileiras. Pois é, minha amiga gosta de marcar a vida de várias mulheres.

Sua aparição na minha vida foi devagar, de mancinho, quase desapercebida. Primeiro vieram as dores abdominais. Mas cólica é normal, certo? Ou não? Para mim não é normal quando junto dela apareceram os vômitos, a queda de pressão, o inchaço. Isso sem falar da tal Tensão Pré- Menstrual (TPM), que é outra grande companheira.


Todos me olhavam com certo dó. O que não é estranho quando uma menina de doze anos não consegue levantar da cama por, pelo menos, uma semana do mês, deixando de lado a escola, as brincadeiras e aventuras ainda infantis. Esses sintomas que eram taxados “normais” ou que me faziam pensar que era fraca para isso, são os que mais representam a luta das mulheres com Endometriose. As cólicas menstruais já são conhecidas pela dor e incomodo que geram, mas a Endometriose é capaz de superar.


O fato de o endométrio ser mais espesso acaba gerando um desconforto em todos os órgãos que ele conseguir se espalhar e as dores não ficam somente nos dias de menstruações, elas estão ali todos os dias dos meses, e se você quiser levantar uma caixa de papelão ou fizer algum esforço a mais, a dor irá aparecer para te dar oi. Quem me falou dela foi uma conhecida da família enquanto eu tentava explicar o porquê não estava me sentindo bem.


Foi a primeira vez que ouvi falar sobre Ela e a primeira vez que escutei “será que você não tem Endometriose?”. Dito e feito! O diagnóstico determinou Endometriose e, a partir disso, surgiram outras frases como “mas nessa idade?”, “esse exame deve estar errado”, “coitada, tão novinha”, “você tem o quê?”, e o pior, “você não vai pode ser mãe?!”. Mais confusão a ser administrada por uma garota.

Essa última foi a que sempre me trouxe mais espanto, como digerir uma pergunta sobre filhos quando ainda se é uma criança? Conforme fui crescendo passei a aceitar essa “ideia” me convencendo de que eu ficaria bem se não pudesse gerar. Mas não é bem assim, descobri que podemos gerar sim, porém temos que recorrer a tratamentos diferentes, passar por alguns exames a mais ou até mesmo por cirurgias, mas a sociedade infelizmente compartilha sempre o lado pior.


Bom, das dúvidas sobre as abas dos absorventes passamos às dúvidas sobre medicamentos: um engorda, aquele da ânsia, esse não deixa comer, o outro é pior que TPM, mas eles eram a única solução oferecida. Apesar das reações, o uso de anticoncepcionais é uma alternativa de tratamento mais comum para a doença, principalmente os que não possuem pausas entre uma cartela ou outra, pois desse modo não ocorre o risco da formação de novos cistos.


Além deles há o tratamento de analgésico para dores e nos casos mais sérios o tratamento cirúrgico, utilizado para remover os pontos de Endometriose e se necessários os órgãos atingidos, como útero, ovários e trompas. No meu caso, minha companheira Endometriose gostou tanto de mim que até me “presenteou” com dois cistos nos ovários, um no lado esquerdo e outro no direito. Eles me deram um trabalhão por anos e juro que tentei me cuidar, até mesmo cuidar deles.


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Porém não tivemos outra escolha a não ser conhecer a sala cirúrgica de um hospital. E, lá fomos nós, eu, Ela e seus frutos. Depois de quase quatro horas de cirurgia era apenas eu e Ela, lutando por uma boa recuperação, pois na mesa cirúrgica deixei metade do meu ovário esquerdo. Isso gerou quinze dias dependendo de pessoas para me ajudar a andar, me alimentar, me banhar e, importante, tentar não rir. Sim, porque até espirrar trazia dores imensas.


Nesse período eu já era realmente uma mocinha, tinha meus dezoito anos, e precisei pausar novamente minha vida por Ela, lançando atestados na faculdade e no trabalho. Depois da recuperação surgiram outras perguntas frequentes “mas agora passou né?”, “então você não tem mais?”, e para elas as mesmas respostas “não, não passou” e a de sempre, “eu tenho Endometriose”.


Ela está aqui e, como eu disse no começo do texto, Ela habita em mim. Ouso dizer que nós duas desenvolvemos uma boa relação atualmente, com respeito, carinho e cuidados. Mas caro leitor, não é fácil, muito menos simples. Uma dor não é apenas dor, não é tão normal como falam. É um assunto sério e que deve ser respeitado. Todas as mulheres que sofrem com Ela devem ter compreensão, seja na casa, na escola, faculdade, trabalho e até mesmo na família.

Além disso, devemos informar e receber informações sobre o assunto, pois seus casos aumentam sempre mais e muitas pessoas descobrem em tempo tardio a doença, não tendo o mesmo resultado que eu tive, tendo que retirar mais órgãos, passar por mais procedimentos cirúrgicos, pausando mais suas vidas. Não é drama, frescura ou fraqueza. É Endometriose, é isso o que é.


Aos meus vinte anos, e lutando com Ela quase metade da minha vida, aprendi muito sobre o assunto e sou grata por chegar aqui bem, mas nem tudo são flores. Dores e limitações ainda existem, as cicatrizes estão aqui para me lembrar de tudo que passei. Mas tudo bem, Ela faz parte de mim.


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Miriã Almeida


Dona do mundinho azul, lutando todos os dias com seus próprios leões. Ela é da paz e pela paz. Futura jornalista e, quem sabe, administradora também. Corajosa por acreditar no amor e medrosa para filmes de terror. Coragens absurdas, medos ingênuos. Não há nada que a impeça de acreditar, a não ser ela mesma, mas pode ter fé, um dia ela chega lá. Lá? Aonde? Aonde ela quiser chegar. (Leia mais aqui!) Foto Pâmela Ramos


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