FOTOGRAFIA de dentro pra fora!
- Lilis | Linhas Livres
- 13 de mai. de 2018
- 6 min de leitura
Atualizado: 19 de set. de 2018
Por Pâmela Ramos
Fotos Camila Fontenele
“Grupos conduzidos por e para mulheres são nosso refúgio psíquico; nosso local para descobrirmos quem somos ou o que podemos nos tornar seres integrais e independentes”. Jean Shinoda Bolen.

No cotidiano que nos cerca em Sorocaba, interior de São Paulo, nada parece mudar. Mulheres e homens trabalham diariamente, cada um com seu modo de conseguir dinheiro no bolso ao fim do mês. Diversos anúncios, espalhados em todos os cantos, eventos, oportunidades de trabalho, publicidade de comércio, entre outros. No meio deles, um chama a atenção: “Residência para Mulheres: Encontro com o Subterrâneo”. Tratava-se de um workshop inédito e exclusivo para fotógrafas.
Realizado com apoio da Prefeitura de Sorocaba, por meio da Secretaria de Cultura e Turismo, a iniciativa, que partiu da fotógrafa e artista visual Camila Fontenele, contou com a participação de 20 mulheres que se reuniram do dia 23 a 27 de abril, passado. No encontro, um espaço de debate sobre o machismo e sexismo na área da fotografia, colaboração para o empoderamento feminino, com objetivo de que ocupem espaços, discursem e tenham sua própria identidade visual em seus registros fotográficos.
A ideia do encontro ocorreu depois que Camila passou por uma situação de machismo ocorrida durante um trabalho realizado em 2015. Na ocasião, ela diz que percebeu que falar sobre ou escrever sobre o assunto não seria o suficiente. E talvez não seja mesmo. Segundo ela, as mulheres na fotografia foram retratadas ao longo da história por homens. Já as mulheres fotógrafas quase não foram e não são citadas.
A pesquisa realizada pela World Press Photo em parceria com a Universidade de Stirling e a Universidade de Oxford – Instituto Reuters, em 2015, confirma isso. O estudo apontou que o setor é masculino, sendo que 85% dos profissionais são homens. Porém, esse resultado aponta que as mulheres atuantes têm maior nível de escolaridade e engajamento nas mídias, além da utilização de novas tecnologias.
Outro exemplo que chancela a situação está na matéria publicada pelo Jornal O Estado de São Paulo (Estadão), intitulada “Guerrilla Girls tomam o Masp e denunciam o sexismo”, publicada em 28 de setembro de 2017. Ela aponta que 6% das artistas em exposição no Museu de Arte de São Paulo (Masp) são mulheres, sendo que 60% dos nus artísticos expostos são femininos. A crítica da organização teve como objetivo ampliar o espaço cedidos para que as mulheres possam divulgar seus trabalhos e não estarem expostas apenas pelos seus corpos nus.
O encontro
Camila Fontenele abriu o Workshop abordando sobre a Narrativa Fotográfica e referência de mulheres fotógrafas/artistas. A bailarina e coreógrafa Evilin Bandeira trabalhou a questão do autoconhecimento para que as mulheres pudessem transpor sua essência na fotografia. Houve exercício com aquarela: O Mar em Mim, com a mediação da Estela Miazzi, que desenvolve uma pesquisa aprofundada em relação à aquarela, arquétipo da baleia e o mar.
Já a artista visual e performer Silvana Sarti conduziu o encontro falando do sagrado feminino na arte e na vida, mostrando referências sobre a figura feminina na história da mitologia e do mundo. No penúltimo dia foi realizado um exercício prático de autorretratos e no último a curadoria dos trabalhos. Em breve haverá uma exposição das fotografias registradas pelas participantes durante a Residência na Fundec (Fundação do Desenvolvimento Cultural de Sorocaba).
“A gente lida com a arte de comunicar em silêncio, então poder transcender o que nos ensinam que é importante, mas ainda transcender para encontrar nossa própria linguagem, nossa própria autenticidade”, contou Camila.

Transformando o olhar de cada uma das mulheres na vivência da Residência, algumas delas relataram a experiência, como a fotógrafa e profissional em leitura de imagem, Letícia Kamada, 42 anos. “É uma experiência bem intensa e surpreendente. A gente sempre espera um monte de coisa, e os movimentos que causaram em mim foram muito mais intensos do que eu já imaginava que seria pelo fato de ter tantas mulheres juntas. Foi uma experiência muito individual e particular, mas ao mesmo tempo muito coletiva”.
O encorajamento e reconhecimento do eu interior foi extremamente trabalhado no encontro, as mulheres puderam parar um tempo e olhar para si mesmas. A fotógrafa Ana Paula Lopes, 25 anos conta que a convivência e a ligação umas com as outras é algo que quer manter, pois o laço e as redes de afeto são umas das coisas mais importantes para ela.
“Está sendo um reencontro comigo, com projetos que a gente acaba não achando possível e vai colocando na gaveta. Foi um momento de arrumar a casa e ver as coisas que escondemos de nos mesmas e começar a por em prática a minha identidade, algo de reconhecer e restaurar”, contou Ana Paula.
Daniela Caramez, 36 anos, formada em publicidade e propaganda, contente com o que vivenciou, relata. “Eu estou em um momento de transformação e de encontro. Estar cercada por mulheres também aparentemente nesse mesmo momento é algo revelador, profundo. Com certeza daqui para frente a visão das coisas e a experimentação vai tomar outro sentido, é transformador”, concluiu Daniela Caramez.
“Vai mudar toda a minha fotografia, porque a cada vez que a gente se conecta mais às pessoas, nós passamos a ter mais empatia e entender melhor, e nessa hora aprendermos a direcionar melhor as pessoas e conseguir passar o sentimento delas nas nossas fotos”, afirmou a fotógrafa Bruna Prenhoratto, 21 anos, sobre o conhecimento que adquiriu.
Após ter a fotografia como profissão, com o tempo e rotina os trabalhos realizados se tornam cotidianos. Com isso, para Cyndi Omoto, 27 anos, formada em Fotografia pela Ceunsp, a residência ajudou a resgatar a essência e inspiração que estava procurando.
“Acho que vou começar a respirar mais, pensar na foto que vou fazer, e não realizar no automático. Se for para fotografar no automático só por venda, eu prefiro não fazer. Não era essa a expectativa que eu tinha para a minha vida, era sempre alguma forma para eu me expressar, não só a parte comercial, mas eu preciso que tenha o meu olhar”, relatou Cyndi Omoto.

Já a fotógrafa e artista visual Pola Fernandez, 60 anos, conta que começou a trabalhar com fotografia a partir dos 50 anos que foi porta de entrada para as artes visuais. Atualmente seus registros são como meio de expressões artísticas com mulheres negras e uma intervenção com o bordado.
Ao se inscrever na Residência para Mulheres, tinha como intuito aprimorar o campo na fotografia como artista visual, e contou “Acho que não vou ver um resultado agora, mas me fez entrar em um processo que me fez refletir e que vai fazer uma diferença no meu produzir artístico, em relação ao convivo com outras mulheres e ao mergulho dentro de mim mesma”.
A oportunidade de participar da Residência permitiu a muitas mulheres se encontrarem e não temerem mergulhar no mar interior de si mesma e explorar ali o refúgio que cada uma carrega na alma. O conhecimento e união delas proporciona uma segurança necessária para divulgarem seus trabalhos e se inspirarem umas nas outras. Camila Fontenele relata que na área em que está inserida profissionalmente atualmente é muito solitária, por isso é importante haver essa troca.
“Eu acho que meu propósito disso é esse acesso, que é muito individual e íntimo, mas que há ferramentas e possibilidade de acessar, claro que durante essa jornada gente vai encontrando pessoas que nos ajudam. Mas, além desse acesso que é muito íntimo, também poder transportar para materialidade, porque acho que tem muitas pessoas que têm um material muito bom, porém acaba não conseguindo transpor isso para a materialidade. E, também acessar essa praticidade que às vezes precisamos abrir mão de algumas coisas, pensar fora da caixa, ou ver as possibilidades e experimentar. Então eu acredito que foi surpreendente por causa disso”.
Além disso, Camila afirma que gostaria de continuar com o projeto e realizar uma Residência anualmente. “A ideia da exposição é essa, para que a cidade conheça quem são essas mulheres e nós sabemos que existem outras mulheres e outras se descobrindo porque elas estão vendo outras aparecendo”, conclui Camila Fontenele.
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Pâmela Ramos
É um conjunto de histórias e sonhos que tem sua essência na música e na vontade insaciável de registros em textos e imagens. Aspirante à fotógrafa, estudante de Jornalismo, aos 19 anos busca eternizar em palavras o que é invisível ao olhar e à fotografia o que, muitas vezes, não se enxerga. Realiza pesquisa em Fotografia Poética e participa de ações sociais de voluntariado. (Leia mais aqui!) Portfólio aqui! Foto San Paiva | Fotopoesia
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